NÃO CRIE MAIS SOFRIMENTO NO PRESENTE
- João Pedro
- 2 de mai. de 2022
- 13 min de leitura
_________________
Sobre o Sofrimento
_________________
O Poder do Agora
capítulo dois
CONSCIÊNCIA: O CAMINHO
PARA ESCAPAR DO SOFRIMENTO
NÃO CRIE MAIS SOFRIMENTO NO PRESENTE
Ninguém tem uma vida livre de sofrimento e mágoa. Não é uma questão de
aprender a viver com isso, em vez de tentar evitar?
A maior parte do sofrimento humano é desnecessária. Ele se forma sozinho, enquanto
a mente superficial governa a nossa vida.
O sofrimento que sentimos neste exato momento é sempre alguma forma de não
aceitação, uma forma de resistência inconsciente ao que é. No nível do pensamento, a
resistência é uma forma de julgamento. No nível emocional, ela é uma forma de
negação. O sofrimento varia de intensidade de acordo com o nosso grau de resistência
ao momento atual, e isso, por sua vez, depende da intensidade com que nos
identificamos com as nossas mentes. A mente procura sempre negar e escapar do
Agora. Em outras palavras, quanto mais nos identificamos com as nossas mentes, mais
sofremos. Ou ainda, quanto mais respeitamos e aceitamos o Agora, mais nos libertamos
da dor, do sofrimento e da mente.
Por que a mente tem o hábito de negar ou resistir ao Agora? Porque ela não consegue
funcionar e permanecer no controle sem que esteja associada ao tempo, tanto passado
quanto futuro, e assim ela vê o atemporal Agora como algo ameaçador. Na verdade, o
tempo e a mente são inseparáveis.
Imagine a Terra sem a vida humana, habitada apenas por plantas e animais. Será que
ainda haveria passado e futuro? Será que as perguntas “que horas são?” ou “que dia é
hoje?” teriam algum sentido para um carvalho ou uma águia? Acho que eles ficariam
intrigados e responderiam: “Claro que é agora. A hora é agora. O que mais existe?”
Não há dúvida de que precisamos da mente e do tempo, mas, no momento em que
eles assumem o controle das nossas vidas, surgem os problemas, o sofrimento e a
mágoa.
Para garantir sua permanência no controle, a mente trabalha o tempo todo para
esconder o momento presente com o passado e o futuro. Assim, a vitalidade e o infinito potencial criativo do Ser, que é inseparável do Agora, ficam encobertos pelo tempo e a
nossa verdadeira natureza é obscurecida pela mente. Todos nós sofremos ao ignorar ou
negar cada momento precioso ou reduzi-lo a um meio para alcançar algo no futuro, algo
que só existe em nossas mentes, nunca na realidade. O tempo acumulado na mente
humana encerra uma grande quantidade de sofrimento cuja origem está no passado.
Se não quer gerar mais sofrimento para você e para os outros, não “crie” mais tempo,
ou, pelo menos, não mais do que o necessário para lidar com os aspectos práticos da
sua vida. Como deixar de “criar” tempo? Tendo uma profunda consciência de que o
momento presente é tudo o que você tem. Faça do Agora o foco principal da sua vida.
Se antes você se fixava no tempo e fazia rápidas visitas ao Agora, inverta essa lógica,
fixando-se no Agora e fazendo visitas rápidas ao passado e ao futuro quando precisar
lidar com os aspectos práticos da sua vida. Diga sempre “sim” ao momento atual. O que
poderia ser mais insensato do que criar uma resistência interior a alguma coisa que já
é? O que poderia ser mais insensato do que se opor à própria vida, que é agora e
sempre agora? Renda-se ao que é. Diga “sim” para a vida e veja como, de repente, a
vida começa a trabalhar mais a seu favor em vez de contra você.
Às vezes, o momento atual é inaceitável, desagradável ou terrível.
As coisas são como são. Observe como a mente julga continuamente o
comportamento, atribuindo nomes às coisas. Entenda como esse processo cria
sofrimento e infelicidade. Ao observarmos o mecanismo da mente, escapamos dos
padrões de resistência e podemos então permitir que o momento atual exista. Isso dará
a você uma prova do estado de liberdade interior, o estado da verdadeira paz interior.
Veja então o que acontece e parta para a ação, caso necessário ou possível.
Aceite, depois aja. O que quer que o momento atual contenha, aceite-o como uma
escolha sua. Trabalhe sempre com ele, não contra. Torne-o um amigo e aliado, não seu
inimigo. Isso transformará toda a sua vida, como por milagre.
DISSOLVENDO O SOFRIMENTO DO PASSADO
Enquanto não somos capazes de acessar o Poder do Agora, vamos acumulando
resíduos de sofrimento emocional. Esses resíduos se misturam ao sofrimento do
passado e se alojam em nossa mente e em nosso corpo. Isso inclui o sofrimento vivido
em nossa infância, causado pela falta de compreensão do mundo em que nascemos.
Todo esse sofrimento cria um campo de energia negativa que ocupa a mente e o
corpo. Se olharmos para ele como uma entidade invisível com características próprias,
estaremos chegando bem perto da verdade. É o sofrimento emocional do corpo.
Apresenta-se sob duas modalidades: inativo e ativo. O sofrimento pode ficar inativo
90% do tempo, ou 100% ativado em alguém profundamente infeliz. Algumas pessoas
atravessam a vida quase que inteiramente tomadas pelo sofrimento, enquanto outras
passam por ele em algumas situações que envolvem relações familiares e amorosas,
lesões físicas ou emocionais, perdas do passado, abandono, etc. Qualquer coisa pode
ativá-lo, especialmente se encontrar ressonância em um padrão de sofrimento do
passado. Quando o sofrimento está pronto para despertar do estágio inativo, até mesmo
uma observação inocente feita por um amigo ou um pensamento é capaz de ativá-lo.
Alguns sofrimentos são irritantes mas inofensivos, como é o caso de uma criança que
não para de chorar. Outros são monstros destrutivos e mórbidos, verdadeiros demônios.
Alguns são fisicamente violentos; outros, emocionalmente violentos. Eles podem atacar
tanto as pessoas à nossa volta quanto a nós mesmos, seus “hospedeiros”. Os
pensamentos e sentimentos relativos à nossa vida tornam-se, então, profundamente
negativos e autodestrutivos. Doenças e acidentes frequentemente acontecem desse
modo. Alguns sofrimentos podem até levar uma pessoa ao suicídio.
Às vezes levamos um choque ao descobrir uma faceta detestável em alguém que
pensávamos conhecer bem. Entretanto, é mais importante observar essa situação em nós
mesmos do que nos outros. Preste atenção a qualquer sinal de infelicidade em você,
qualquer que seja a forma, pois talvez seja o despertar do sofrimento. Ele pode se
manifestar como uma irritação, um sinal de impaciência, um ar sombrio, um desejo de
ferir, sentimentos de raiva, ira, depressão ou uma necessidade de criar algum tipo de
problema em seus relacionamentos. Agarre o sinal no momento em que ele despertar de
seu estado inativo.
O sofrimento deseja sobreviver, mas, para isso, precisa conseguir que nos
identifiquemos inconscientemente com ele. Portanto, quando o sofrimento toma conta de
nós, cria uma situação em nossas vidas que reflete a própria frequência de energia da
qual ele se alimenta.y Sofrimento só se alimenta de sofrimento. Não consegue se
alimentar de alegria. Acha-a indigesta.
Quando o sofrimento nos domina, faz com que desejemos ter mais sofrimento.
Passamos a ser vítimas ou perpetradores. Queremos infligir sofrimento, ou senti-lo, ou
ambos. Na verdade, não há muita diferença entre os dois. É claro que não temo consciência disso e afirmamos que não queremos sofrer. Mas preste bem atenção e verá
que o seu pensamento e o seu comportamento estão programados para continuar com o
sofrimento, tanto para você quanto para os outros. Se você estivesse consciente disso, o
padrão iria se desfazer, porque desejar mais sofrimento é uma insanidade, e ninguém é
insano conscientemente.
O sofrimento, a sombra escura projetada pelo ego, tem medo da luz da nossa
consciência. Teme ser descoberto. Sobrevive graças à nossa identificação inconsciente
com ele, assim como ao medo inconsciente de enfrentarmos o sofrimento que vive
dentro de nós. Mas se não o enfrentarmos, se não direcionarmos a luz da nossa
consciência para o sofrimento, seremos forçados a revivê-lo. O sofrimento pode nos
parecer um monstro perigoso, mas eu lhe garanto que se trata de um fantasma frágil. Ele
não pode prevalecer sobre o poder da nossa presença.
Alguns ensinamentos espirituais dizem que todo sofrimento é, em última análise, uma
ilusão, e isso é verdade. A questão é se isso é uma verdade para você. Acreditar
simplesmente não transforma nada em verdade. Você quer sofrer para o resto da vida e
permanecer dizendo que é uma ilusão? Será que essa atitude livra você do sofrimento?
O que nos interessa aqui é o que podemos fazer para vivenciar essa verdade, ou seja,
torná-la real em nossas vidas.
Portanto, o sofrimento não quer que nós o observemos diretamente e vejamos o que
ele realmente é. No momento em que o observamos, sentimos seu campo energético
dentro de nós e desfazemos nossa identificação com ele, surge uma nova dimensão da
consciência. Chamo a isso presença. Passamos a sert testemunhas ou observadores do
sofrimento. Isso significa que ele não pode mais nos usar, fingindo ser nosso eu interior.
Então, não temos mais como realimentá-lo. Aqui está nossa mais profunda força
interior. Acabamos de acessar o Poder do Agora.
O que acontece ao sofrimento quando nos tornamos conscientes o bastante
para romper a nossa identificação com ele?
A inconsciência cria o sofrimento. A consciência transforma o sofrimento nela
mesma. São Paulo expressa esse princípio universal de uma forma linda ao dizer:
“Tudo é revelado ao ser exposto à luz e o que fort exposto à própria luz se torna luz.”
Assim como não se pode lutar contra a escuridão, não se pode lutar contra o sofrimento.
Tentar fazer isso poderia gerar um conflito interior e um sofrimento adicional. Observar
o sofrimento já é o bastante. Observá-lo implica aceitá-lo como parte do que existe
naquele momento.
O sofrimento consiste na energia vital aprisionada que se desprendeu do campo
energético total e se fez temporariamente autônoma, através de um processo artificial de identificação com a mente. Ela se volta para dentro de si mesma e se torna algo
contrário à vida, como um animal tentando comer o próprio rabo. Por que você acha
que a nossa civilização se tornou tão autodestrutiva? Acontece que as forças destrutivas
da vida ainda são energia vital.
Mesmo quando começamos a deixar de nos identificar e nos tornamos observadores,
o sofrimento ainda continua a agir por um tempo e vai tentar fazer com que voltemos a
nos identificar com ele. Embora não esteja mais recebendo a energia originada da nossa
identificação com ele, o sofrimento ainda tem sua força, como uma roda-gigante que
continua a girar, mesmo quando deixa de receber o impulso. Nesse estágio, o
sofrimento pode até ocasionar dores em diversas partes do corpo, mas elas não vão
durar. Esteja presente, fique consciente. Vigie o seu espaço interior. Você vai precisar
estar presente e alerta para ser capaz de observar o sofrimento de um modo direto e
sentir a energia que emana dele. Agindo assim, o sofrimento não terá força para
controlar o seu pensamento. No momento em que o seu pensamento se alinha com o
campo energético do sofrimento, você está se identificando com ele e, de novo,
alimentando-o com os seus pensamentos.
Por exemplo, se a raiva é a vibração de energia que predomina no sofrimento e você
alimenta esse sentimento, insistindo em pensar no que alguém fez para prejudicá-lo ou
no que você vai fazer em relação a essa pessoa, é porque você já não está mais
consciente, e o sofrimento se tornou “você”. Onde existe raiva, existe sempre um
sofrimento oculto. Quando você começa a entrar em um padrão mental negativo e a
pensar como a sua vida é horrorosa, isso quer dizer que o pensamento se alinhou comt o
sofrimento e que você se tornou inconsciente e vulnerável a um ataque do sofrimento.
Utilizo a palavra “inconsciência” no presente contexto para expressar uma identificação
com um padrão mental ou emocional. Isso implica a ausência completa do observador.
Manter-se em um estado de alerta consciente destrói a ligação entre o sofrimento e o
mecanismo do pensamento, e aciona o processo de transformação. É como se o
sofrimento se tornasse o combustível para a chama da consciência, resultando em um
brilho de mais intensidade. Esse é o significado esotérico da antiga arte da alquimia: a
transformação do metal não precioso em ouro, do sofrimento em consciência. A
separação interior cicatriza, e você se torna inteiro outra vez. Cabe a você, então, não
criar um sofrimento adicional.
Resumindo o processo: concentre a atenção no sentimento dentro de você. Reconheça
que é o sofrimento. Aceite que ele esteja ali. Não pense a respeito. Não permita que o
sentimento se transforme em pensamento. Não julgue nem analise. Não se identifique
com o sentimento. Esteja presente e observe o que está acontecendo dentro de você.
Perceba não só o sofrimento emocional, mas também a presença “de alguém que
observa”, o observador silencioso. Esse é o Poder do Agora, o poder da sua própria presença consciente. Veja, então, o que acontece.
Em inúmeras mulheres, o sofrimento manifesta-se, em particular, no período anterior
ao fluxo menstrual. Mais adiante, comentarei as razões pelas quais isso acontece. No
momento, o importante é que você seja capaz de estar alerta e presente quando o
sofrimento aparecer e de observar o sentimento em vez de se deixar dominar por ele.
Essas atitudes proporcionam uma oportunidade para a mais poderosa das práticas
espirituais e tornam possível uma rápida transformação de todo o passado.
A IDENTIFICAÇÃO DO EGO COM O SOFRIMENTO
O processo que acabei de descrever é extremamente poderoso, embora simples.
Poderia ser ensinado a uma criança, e tenho a esperança de que um dia será uma das
primeiras coisas a serem aprendidas na escola. Uma vez entendido o princípio básico
do que significa estar presente observando o que acontece dentro de nós – e
“entendemos” isso quando passamos pela experiência –, teremos à nossa disposição a
mais poderosa ferramenta de transformação.
Não nego que podemos encontrar uma forte resistência interna tentando nos impedir
de pôr fim à identificação com o sofrimento. Isso acontecerá particularmente se
tivermos vivido intimamente identificados com o sofrimento emocional durante a maior
parte da vida e se tivermos investido nele uma grande parte ou mesmo todo o nosso
sentido de eu interior. Isso significa que construímos um eu interior infeliz por conta do
nosso sofrimento e acreditamos que somos essa ficção fabricada pela mente. Nesse
caso, nosso medo inconsciente de perder a identidade vai criar uma forte resistência a
qualquer forma de não identificação. Em outras palavras, você preferiria viver com o
sofrimento – ser o sofrimento – a saltar para o desconhecido, correndo o risco de
perder o seu infeliz mas familiar eu interior.
Se esse é o seu caso, observe a resistência dentro de você. Observe o seu apego ao
sofrimento. Esteja muito alerta. Observe como é estranho ter prazer em ser infeliz.
Observe a compulsão de falar ou pensar a esse respeito. A resistência deixará de existir
se você torná-la consciente. Poderá então dar atenção ao sofrimento, estar presente
como testemunha e iniciar a transformação.
S ó você pode fazer isso. Ninguém pode fazer por você. Mas, caso tenha bastante sorte para encontrar alguém intensamente consciente, se puder estar com essa pessoa e
juntar-se a ela no estado de presença, isso poderá ser de grande utilidade, acelerando o
processo. Se isso acontecer, a sua própria luz logo brilhará mais forte. Quando
colocamos um pedaço de lenha que tenha começado a queimar há pouco tempo perto de
outro que está queimando vigorosamente e, depois, separamos os dois novamente, o
primeiro tronco passará a queimar com uma intensidade muito maior. Afinal de contas,
é o mesmo fogo. Ser um fogo dessa natureza é uma das funções de um mestre espiritual.
Alguns terapeutas estão aptos a preencher essa função, desde que tenham alcançado um
ponto além do nível de consciência e sejam capazes de criar e sustentar um estado de
presença intensa e consciente enquanto estiverem trabalhando com você.
A ORIGEM DO MEDO
Você mencionou o medo como uma parte do nosso sofrimento emocional
latente. Por que há tanto medo na vida das pessoas? Uma certa dose de
medo não é saudável? Se eu não tivesse medo do fogo, poderia colocar
minha mão dentro dele e me queimar.
A razão pela qual não colocamos a mão no fogo não é o medo, e sim a certeza de que
vamos nos queimar. Não é preciso ter medo para evitar um perigo desnecessário, basta
um mínimo de inteligência e bom senso. Nessas questões práticas, é muito útil
aplicarmos as lições do passado. Mas se alguém nos ameaça com fogo ou com
violência física, talvez experimentemos uma sensação como o medo. É uma reação
instintiva ao perigo, sem relação com a doença psicológica do medo de que estamos
tratando aqui. A doença psicológica do medo não está presa a qualquer perigo imediato
concreto e verdadeiro. Manifesta-se de várias formas, tais como agitação, preocupação,
ansiedade, nervosismo, tensão, pavor, fobia, etc. Esse tipo de medo psicológico é
sempre de alguma coisa que poderá acontecer, não de alguma coisa que está
acontecendo neste momento. Você está aqui e agora, ao passo que a sua mente está no
futuro. Essa situação cria um espaço de angústia. E caso estejamos identificados com as
nossas mentes e tivermos perdido o contato com o poder e a simplicidade do Agora,
essa angústia será a nossa companhia constante. Podemos sempre lidar com uma
situação no momento em que ela se apresenta, mas não podemos lidar com algo que é
apenas uma projeção mental. Não podemos lidar com o futuro.
Além do mais, enquanto estivermos identificados com a mente, o ego regerá as
nossas vidas, como mencionei anteriormente. Por conta da sua natureza ilusória apesar dos elaborados mecanismos de defesa, o ego é muito vulnerável e inseguro e vê
a si mesmo sob constante ameaça. Esse é o caso aqui, mesmo que o ego seja muito
confiante em sua forma externa. Agora, lembre-se de que uma emoção é a reação do
corpo à mente. Que mensagem o corpo está recebendo permanentemente do ego, o falso
eu interior construído pela mente? Perigo, estou sob ameaça. E qual é a emoção gerada
por essa mensagem permanente? Medo, é claro.
O medo parece ter várias causas – tememos perder, falhar, nos machucar –, mas em
última análise todos os medos se resumem em um só: o medo que o ego tem da morte e
da destruição. Para o ego, a morte está bem ali na esquina. No estado de identificação
com a mente, o medo da morte afeta cada aspecto da nossa vida. Por exemplo, mesmo
uma coisa aparentemente trivial ou “normal”, como a necessidade de estar certo em um
argumento e demonstrar à outra pessoa que ela está errada, defendendo a posição
mental com a qual nos identificamos, acontece por causa do medo da morte. Se
estivermos identificados com
uma atitude mental e descobrirmos que estamos errados, nosso sentido de eu interior
baseado na mente corre um sério risco de destruição. Portanto, assim como o ego, você
não pode errar. Errar é morrer. Muitas guerras foram travadas por causa disso e
inúmeros relacionamentos foram destruídos.
Uma vez que não estejamos mais identificados com a mente, não faz a menor
diferença para o nosso eu interior estarmos certos ou errados. Assim, a necessidade
compulsiva e profundamente inconsciente de ter sempre razão – o que é uma forma de
violência – vai desaparecer. Você poderá declarar de modo calmo e firme como se
sente ou o que pensa a respeito de algum assunto, mas sem agressividade ou qualquer
sentido de defesa. O sentido do eu interior passa a se originar de um lugar profundo e
verdadeiro dentro de você, não mais de sua mente. Tenha cuidado com qualquer tipo de
defesa dentro de você. Está se defendendo de quê? De uma identidade ilusória, de uma
imagem em sua mente, de uma entidade fictícia? Ao trazer esse padrão à consciência,
ao testemunhá-lo, você deixa de se identificar com ele. Sob a luz da sua consciência, o
padrão de inconsciência irá se dissolver rapidamente. Esse é o fim de todos os
argumentos e jogos de poder, tão prejudiciais aos relacionamentos. O poder sobre os
outros é a fraqueza disfarçada de força. O verdadeiro poder é interior e está à sua
disposição agora.
O medo será uma companhia constante para qualquer pessoa que esteja identificada
com a mente e, portanto, desconectada do seu verdadeiro poder, o eu profundo
enraizado no Ser. O número de pessoas que conseguiram alcançar o ponto além da
mente ainda é extremamente pequeno, o que nos leva a presumir que, virtualmente,
todas as pessoas que você encontra ou conhece vivem em um estado permanente de
medo. Só o que varia é a intensidade. Ele flutua entre a ansiedade e o pavor numa ponta da escala e um desconfortável, vago e distante sentido de ameaça na outra. Muitas
pessoas só tomam consciência disso quando o medo assume uma de suas formas mais
agudas.
A BUSCA DO EGO PELA PLENITUDE
Um outro aspecto do sofrimento emocional é uma profunda sensação de falta, de
incompletude, de não se sentir inteiro. Em algumas pessoas isso é consciente, em
outras, não. Quando está consciente, a pessoa tem uma sensação inquietante de que não
é respeitada ou boa o bastante. Na forma inconsciente, essa sensação se manifesta
indiretamente como um anseio, uma necessidade ou uma carência intensa. Em ambos os
casos, as pessoas podem acabar buscando compulsivamente uma forma de gratificar o
ego e preencher o buraco que sentem por dentro. Assim, empenham-se em possuir
propriedades, dinheiro, sucesso, poder, reconhecimento ou um relacionamento especial,
para se sentirem melhor e mais completas. Porém, mesmo quando conseguem todas
essas coisas, percebem que o buraco ainda está ali e não tem fundo. As pessoas veem,
então, que estão realmente em apuros, porque não podem mais se enganar. Na verdade,
elas continuam tentando agir como antes, mas isso se torna cada vez mais difícil.
Enquanto o ego dirige a nossa vida, não conseguimos nos sentir à vontade, em paz ou
completos, exceto por breves períodos, quando acabamos de ter um desejo satisfeito. O
ego precisa de alimento e proteção o tempo todo. Tem necessidade de se identificar
com coisas externas, como propriedades, status social, trabalho, educação, aparência
física, habilidades especiais, relacionamentos, história pessoal e familiar, ideais
políticos e crenças religiosas. Só que nada disso é você.
Levou um susto? Ou sentiu um enorme alívio? Mais cedo ou mais tarde, você vai ter
que abrir mão de todas essas coisas. Pode ser difícil de acreditar, e eu não estou aqui
pedindo a você que acredite que a sua identidade não está em nenhuma dessas coisas.
Você vai conhecer por si mesmo a verdade, lá no fim, quando sentir a morte se
aproximar. Morte significa um despojar-se de tudo o que não é você. O segredo da vida
é “morrer antes que você morra” – e descobrir que não existe morte.
capítulo dois
CONSCIÊNCIA: O CAMINHO
PARA ESCAPAR DO SOFRIMENTO
Comentários